segunda-feira, agosto 24

Don't let memories go of me and you; The world is down there out of view ...


Ele senta na velha pedra. Aquele lugar sempre foi o seu lugar. “Ela não está aqui”. Ele olha o lago. Aquelas águas frias e calmas refletem tudo que ele tem. Tudo que ele deixou para traz. Tudo que ele perdeu. “Ela não está aqui”. Uma lágrima começa a nascer do canto de seus olhos. A poeira das ruas da cidade cobre seus pés. “Ela não está aqui”. Ele voltou a esse lugar por ela. Essa cidade proibida não tem nada para ele; exceto ela. “Ela não está aqui”. A Guerra acabou agora. Eles poderiam ficar em paz... se ela estivesse esperando. Ela me esqueceu. A lágrima que começava a nascer, morreu de repente, antes mesmo de rolar, quando este ultimo pensamento cruzou sua mente.
“Ela me esqueceu...” repetia ele, para si mesmo, enquanto fitava seu próprio reflexo contrastando com a calmaria da água. Sim, ele havia prometido ‘Nunca esquecer. Nunca’. Nenhum tempo seria capaz de apagar a promessa. Nem mesmo a morte seria capaz de apagar a memória. Mas... Ela não está lá. Ela não o viu voltar, não correu para os seus braços como jurou que faria. Ela se foi, e não tem volta. Ele sente-se magoado, traído, irado. Não quer mais saber. Não vai procurá-la.
Ele não sabe da carta que ela deixou. E nem vai saber, por que não se deu ao trabalho de procurar vestígios dela. Ela teve que partir, é fato, mas ela iria voltar, eles teriam tempo para se encontrar de novo. Não foi sua escolha não estar ali, no mesmo campo, olhando para o mesmo lago que ele agora olha, esperando que ele voltasse. E ele nem imagina quantas tardes ela passou olhando para aquele lago, sonhando com o momento em que o veria chegar e toma-la nos braços. “Malditos problemas” praguejava, enquanto pensava em como ele iria ficar triste se chegasse e ela não estivesse.
É verdade, ele não sabia a que linhagem ela pertencia, mas era ela a herdeira da família, o que podia fazer? Teria que se apresentar. Seu pai havia escolhido um péssimo momento para finalmente agir como pai. Apenas sua morte era capaz de faze-la ver a família de novo. E ela tinha que ir.
Deixou uma carta para ele, para que ele soubesse. “Nunca esquecer. Nunca.” Ela repetia para si mesma, enquanto secava as lágrimas e olhava para o lago. O mesmo lago. Sempre o mesmo lago. O lago onde se conheceram, onde passaram seus melhores momentos, onde se separaram. O lago que guarda as lágrimas que ela derramou enquanto escrevia a carta. O lago que o viu partir com ódio no coração, culpando-a por algo que nunca fez. Nunca esqueceu. O mesmo lago que refletia tudo que ela tem. Tudo que ele deixou para traz. Tudo que ela perdeu.
A carta era simples. Seu irmão devia entregá-la, mas o Soldado partiu do mesmo modo que chegou. Sozinho e quieto. Mas sem motivos pra seguir, dessa vez. Se ele tivesse lido, saberia. Saberia que ela ia voltar para os seus braços, saberia que nem a morte poderia separá-los. Saberia que ela nunca esqueceu.
“Queria ser a primeira a abraçá-lo e vê-lo em casa. Só haverá realmente uma casa para descansar depois que tudo estiver resolvido. Eu vou voltar a vê-lo. Peço que me espere, do mesmo modo que esperei dias e noite por seu regresso. Sei que meu motivo para partir é muito menos nobre, porém minha partida será muito mais curta. Eu volto.
Renovo aqui minha promessa: Nem que a morte chegue, nem que os continentes nos separem, nem que a eternidade acabe; eu nunca irei te esquecer.  Então lhe peço, amado dono de meu coração, não esqueças de mim.”.
Ele partiu, sem ler a carta, sem saber da verdade, com mágoa em seu coração. Ela? Passou a vida esperando-o, e ainda hoje o espera. Espera que ele note o seu engano, que o que os uniu seja mais forte do que o que os separou e ele possa finalmente se deitar em seu abraço. Uma vez lhe disseram que 'casais apaixonados nem sempre ficam juntos no final', mas ela sabe. Sabe que se não estão juntos, é por que não chegou ao final ainda.

quinta-feira, agosto 13

Caio Fernando de Abreu

"porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicidio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituimos expressões fatais como "não resistirei" por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência."